quarta-feira, dezembro 01, 2004

Um meta post

Para aquelas dezenas de almas que vêm parar a este blog em busca da definição de logorreia, aqui me desobrigo:



Logorreia

do Gr. lógos, discurso + rhoía, que corre

s. f., necessidade irresistível de falar que apresentam certos alienados;
verbosidade inútil e sem sentido.


A verdadeira rentrée



A dissolução da Assembleia da República e consequente queda do Governo de Santana Lopes marca o verdadeira fim da silly season de 2004.

terça-feira, novembro 30, 2004

E pronto...



O Conselho de Estado vai ser convocado. Ao que tudo indica, o Governo cairá e a Assembleia da República será dissolvida.

Santana Lopes acabou de dizer:

[...] O senhor Presidente acabou de me comunicar a decisão de iniciar os contactos institucionais com vista à dissolução do parlamento [...]
Como sempre respeito a decisão do senhor Presidente da República.
Não concordo, mas respeito. Não temo eleições antecipadas. Vamos tentar defender os interesses de Portugal [...]

Mulholland Dr.



Filipe Faria diz:

A industria onírica inicia a sua demanda pelo sentido pseudo lógico.
O objectivo da arte não é ter sentido aparente, é despertar algo dentro de cada um que a observa ... Se o senhor Lynch consegue isso com inúmeras mentes (não acredito que sejam todos “intelectuais”, ou "wanna be´s", ou "whatever"), tudo o resto são formulários de lógica que pouco interessam para a finalidade artística.

E eu digo:

É o paroxismo do incompreensível.

Uma coisa é comunicar sensações em bruto, sem um construto destinado à cognição. Outra é a masturbação intelectual de atirar aos outros retalhos inintelegíveis para gáudio daqueles que podem, assim, reservar para si um putativo entendimento dessa obscura arte do absurdo.

Não estou certo se este filme de Lynch cabe na primeira, na segunda ou em outra categoria.

Talvez seja um génio. Não serei eu o juiz disso.

Como dizes, o objectivo da arte pode ser simplesmente despertar sensações em bruto. Nesta concepção, um grito pode ser uma manifestação artística. Não tenho nada a opôr. Mas, nesta instância, prefiro a experiência directa.

Valorizo muito mais a arte que constrói sobre as sensações. Que as relaciona, perspectiva e explora.

Em todo o caso, existem algumas interpretações interessantes do filme de David Lynch aqui.

domingo, novembro 28, 2004

Hoje é Domingo



Os Babilónios são a primeira civilização de que há registo da utilização de uma semana de 7 dias, dedicados às 7 luminárias (Sol, Lua e cada um dos 5 planetas visíveis).

A norma ISO 8601 prescreve que a semana tem início à segunda-feira. O Domingo é, por isso, o último dia da série.

A tradição cristã reserva o Domingo, dia do Senhor, para a adoração divina.

Para nós, ateus, este dia não passa de 24 horas cheias de tédio.

sexta-feira, novembro 26, 2004

Sobre coisa nenhuma



Tenho algo (quase) inútil para partilhar convosco.

Passei as últimas horas a dedicar-me ao assunto e penso estar em condições de anunciar a todos os interessados que tenho uma prova que o mínimo dos elementos de qualquer intervalo definido sobre uma lista de índices dos nós visitados de uma árvore durante uma travessia em profundidade-primeiro corresponde ao índice do antepassado comum mais próximo dos extremos do intervalo.

[...]

Quod erat demonstrandum

segunda-feira, novembro 15, 2004

Rufus Wainwright @ Aula Magna



Sábado, 13 de Novembro, 22 horas.

As luzes da Aula Magna apagam-se de repente.

No meio de fumo e de uma melodia a evocar Judy Garland entra em palco Rufus Wainwright.

Daí em diante foram quase duas horas de êxtase.

Para mim foi uma espécie de baptismo musical. Foi a primeira vez que fui a um grande concerto de música Pop de grande qualidade e fiquei siderado.

A espontaneidade, a autenticidade e a tensão emocional do trabalho de Rufus Wainwright fizeram-me experienciar o numinoso naquela noite de Sábado.

O artista também gostou da audiência. Em várias ocasiões disse estar surpreendido pela recepção calorosa e ficou a promessa de voltar com a banda.

Da minha parte, foi o confirmar de uma paixão.

Come back soon, Rufus!

quinta-feira, novembro 04, 2004

Activar o ADN



Este era o título de um artigo da revista Xis do Público de 30 de Outubro, cujo tema era este livro .

O livro, escrito por Robert Gerard, PhD fala sobre como "activar a informação contida no nosso ADN" para que passemos a "aproveitar plenamente o nosso potencial e, assim, ter uma vida mais equilibrada e saudável". Quem ficou com a estranha sensação de que isto se trata de uma reedição da ideia de que usamos apenas 10% do cérebro acertou em cheio.

O livro não li (e, diga-se, não tenciono). O artigo da revista Xis, no entanto, faz adivinhar um chorrilho de disparates new age que atingem proporções indizíveis. O pior é que o comentário ao livro não está em nenhuma secção de humor da revista. É apresentado como um livro sério e proveitoso para os leitores do Público.

Numa época em que todos andamos com a expressão "Sociedade do Conhecimento" na boca, estes tiques de obscurantismo com jargão pseudo-científico só têm paralelo nas crenças medievais.

Quer o senhor Doutor Robert Gerard dizer que andamos todos com o ADN inactivo e que por via das suas "orações de cura do ADN" podemos activá-lo? Este tipo de afirmações não tem ponta por onde se lhe pegue.

Eu tinha a inocente ideia de que o objectivo dos jornais era informar. Embora tolere frivolidades nos seus suplementos não consigo encaixar nenhum tipo de serviço neste tipo de estupidez inenarrável.


Quem se senta à frente, de novo



O povo americano escolheu ontem os membros do Colégio Eleitoral que vai eleger o próximo Presidente dos Estados Unidos num exercício de uma democracia incompreensível para os olhos europeus.

Não só o sistema eleitoral americano parece ser inutilmente rebarbativo como o mundo (fora da América) tem dificuldade em compreender como é que o presidente mais pateta da história americana pode conseguir uma expressiva reeleição.

O The Economist colocava a questão "Bush vs Kerry" desta forma: "The Incompetent OR The Incoherent?". E eu coloco desta: "Como raio é que é possível?".

Um presidente que partiu as tábuas da lei internacional, que levou o conceito de unilateralismo americano a limites inéditos, que criou o maior défice orçamental na história dos Estados Unidos... um presidente virtualmente analfabeto obteve uma das votações mais expressivas de sempre.

Isto leva-nos necessariamente a questionar os fundamentos da Democracia.

Em todo o caso acredito, acima de tudo, na soberania dos Estados e no direito de se organizarem da forma que entenderem. Estaria verdadeiramente angustiado hoje se fosse americano. Não sendo este o caso só posso desejar que a Europa saiba proteger-se das contingências das eleições americanas.

A americanofilia sofreu nestes últimos 4 anos golpes severos e tudo indica que continuará a definhar nos próximos 4. A sociedade americana tem sido nas últimas décadas uma referência fundamental para o resto do mundo mas as suas atitudes despóticas e imperialistas têm vindo igualmente a semear ódios e a fazer nascer vários tipos de anti-americanismo.

Não são apenas odiados por serem melhores. São também odiados porque podiam ser muito mais do que são.

Resta citar um texto de Hugo Fonseca,

Hoje parece ser um dia triste para a maioria dos Europeus. "Four more years" (o slogan republicano para a re-eleição do Bush) pegou e ficou. E a reacção tem vindo de vários quadrantes. Hoje alguém perguntou-me: "tens a noção que vives entre atrasados mentais?" (Portugal). Outra pessoa dizia-me "I am still in denial" (EUA). Outro ainda disse que eram como viver em 2003 e perceber que o Bush fica até 2008 sem eleições (EUA).

Vivo no condado do Cuyahoga, onde fica Cleveland. Todos os olhos estavam fixados em nós ontem à noite: quem iria ganhar o Ohio? Os resultados das principais cidades saiam, mas do Cuyahoga publicavam-se poucos ou nenhums resultados. Afinal, as mesas de voto tinham fechado às 19:30 e porque raio era 23:00 e ainda só se tinha 15% das votações? O facto é que os americanos em muitos aspectos ofereceram uma lição de humildade do mundo sobre a democracia.

Não existem sistemas perfeitos de democracia. Mas ontem foram às urnas mais de 100 milhões de pessoas votar nas eleições mais importantes algumas vez na memória do país (e do mundo?). Sabia-se que muita gente iria votar pela primeira vez e que muita gente que tinha preferido ficar em casa em eleições anteriores iria votar desta vez. Nunca se pensou que tanta gente aparecesse. O resultado foram filas e horas e horas de espera. Horas e horas de espera onde as mesas não fechavam porque toda a gente contava e ninguém fica para trás. Muitas mesas do Cuyahoga não fecharam antes das 21:00 e das 22:00 (de acordo com o reportado na televisão). A corrida presidencial decorreu em feição: não houve problemas com o voto electrónico; não houve intimidação para com os eleitores; houve um vencedor claro e absoluto 24 horas depois das eleições - e um que ganhou o total nacional.

No Cuyahoga as pessoas esta tarde estavam tristes e a chuva que caía sobre Cleveland ajudava ao clima triste. Afinal cerca de 68% das pessoas votaram em Kerry, tendo ganho dentro do condado com uma margem de 220.000 votos (total só mesmo ultrapassado em Philadelphia). Ninguém no Ohio queria tanto uma vitória do Kerry como em Cleveland, mas a cidade não são os campos e as áreas suburbanas do país. Esse país distante que chamamos América escolheu o seu candidato; mas essas pessoas não vivem ao pé das antigas torres gémeas, não olham todos os dias sobre Manhatan e não sentem o medo de andar de metro todos os dias; essas pessoas não sentem as ameaças de segurança todos os dias contra os prédios do FMI ou do Banco Mundial. A "América real" escolheu o seu candidato: pelos valores conservadores, apoiados na religião e agitando os fantasmas do medo. É esta a América com que temos que lidar.


O que eles querem



O "homem moderno" não existe.

Aquilo que se convenciou chamar de metrossexual é um conceito absolutamente imaterial na nossa sociedade. Do mesmo modo, as únicas revistas masculinas que existem versam sobre material pornográfico, futebol e novidades automóveis. Todas as outras têm como único público-alvo a comunidade homossexual.

Ora, isto não implica que não existam pessoas do sexo masculino com as putativas características de um "metrossexual", mas é mais fácil explicá-las como idiossincrasias do indivíduo do que como um grupo social.

O homem típico tem três grandes paixões na vida: futebol (ou qualquer outro desporto de substituição, desde que possa ser palco de manifestação da sua virilidade), mulheres e beber cerveja com os amigos. Todas as restantes actividades da sua vida têm como objectivo último satisfazer uma das paixões mencionadas.

Assim, o homem típico não perde tempo a ler, a perorar sobre a vida ou a escrever em blogs, excepto se tiver a percepção de que, de alguma forma, estas actividades permitam um acesso mais imediato ou com maior sucesso às supracitadas paixões.

O sucesso profissional, a estabilidade financeira e a exuberância física trazem ao homem típico, com grande probabilidade, mais mulheres. Por isso, ele persegue estes objectivos com quase tanto afinco como o objecto do seu desejo.

Ao contrário da mulher, o homem típico define-se, ou melhor, define a sua virilidade por oposição aos outros homens. Num grupo masculino, todos competem pelo sucesso: querem ser os mais entendidos em futebol, querem ter o maior sucesso com as mulheres e querem ser o campeão social das cervejolas. Enquanto que a mulher típica se define em função do homem que pretende agradar, o homem típico define-se em função dos seus pares, por vezes numa atitude autista em relação ao verdadeiro interesse das mulheres.

Dito isto, aceito todas as acusações de misantropia.

segunda-feira, novembro 01, 2004



O que elas querem



É comum dizer-se que as mulheres são inescrutáveis. Um ser misterioso sobre o qual é impossível aos homens delinear uma teoria da mente.

Não acredito que isto seja verdade.

Por outro lado, também não acredito que as mulheres possam ser caracterizadas ou mesmo definidas como se fossem meras variações do mesmo molde.

Algumas das pessoas mais admiráveis que conheço são do sexo feminino. Mas é também entre as mulheres que encontro algumas das facetas mais pungentes da humanidade.

A mulher moderna alimenta-se daquelas revistas que não fazem mais do que a reduzir a uma espécie de dona-de-casa sofisticada. A retórica é a da libertação feminina, mas o objectivo latente é sistematicamente o de casar bem, construir uma família e ter muitos filhos. No fundo, a mulher moderna continua a definir-se pela sua capacidade de agradar à sua cara-metade.

E nesta tentativa de sofisticação artificial a mulher caminha inevitavelmente para a mediocridade. Os objectivos a que se propõe são demasiado fáceis, demasiado os mesmos de sempre.

A mulher é, portanto, a primeira e mais profunda vítima de uma sociedade que se constrói com base na noção de êxito. Porque o êxito que se lhes reserva é simplesmente o sucesso na maternidade.

Os efeitos laterais deste estado de coisas é uma feminidade intolerante com tudo aquilo que frustre este programa. No fundo, a mulher moderna odeia tudo aquilo que nega o seu estatuto de fêmea e o seu papel tradicional na sociedade. A mulher moderna sonha com o homem viril do qual depende para se definir e não suporta nenhum sinal de fraqueza, de feminidade, em suma, de humanidade num homem.

É profundamente triste que as mulheres de hoje reclamem somente este papel de co-existência. É profundamente triste...


domingo, outubro 31, 2004



Esta semana que passou, e ao fim de quase 26 anos, perdi o meu estatuto de unigénito.

É verdade, nasceu a minha irmã. Tem cara de traquina, dedos de cravista e faz umas caretas adoráveis. A Inês veio ao mundo tranquilamente e assim permanece.

A sua indiferença às "grandes questões" remete-nos para a simplicidade fundamental da vida. A minha irmã goza agora de uma total e genuína liberdade, mas também de uma saudável dependência dos que a rodeiam.

Ao longo da vida perderá progressivamente ambas. Espero que o faça graciosamente.

quarta-feira, setembro 29, 2004

De volta ao trabalho



Com o início deste semestre começa também uma nova fase da minha vida.

Depois de terminar a licenciatura decidi deslocar-me em contra-ciclo. Após cerca de 6 anos no mundo real, com recibos de ordenado e IRS para pagar, eis que deixo a indústria para voltar a ser estudante, no sentido estrito.

Iniciei este mês o meu mestrado - um percurso que me deverá ocupar cerca de um ano.

Juntamente com promessas de realização pessoal, por via da actividade de investigação, vêm os votos de uma vida monástica suportada por pouco mais do que uma bolsa que representa apenas uma fracção daquilo que qualquer recém-licenciado consegue no mundo do trabalho.

Muitos se interrogam se não terá sido uma atitude temerária, especialmente se tivermos em conta as oscilações imprevisíveis da economia, deixar um emprego estável e um contrato sem termo para perseguir um sonho.

O mundo real e o mundo académico não se compadecem com lirismos oníricos. Seria, por isso, um sinal de ingenuidade pensar que poderia justificar esta minha decisão com uma mera fixação de juventude. Se assim fosse, poderia igualmente perseguir uma carreira como guarda-freio, com a qual sonhava frequentemente na infância.

Antes de mais, optar por um mestrado a tempo inteiro é um desafio, uma auto-descoberta, um teste ao limite das minhas capacidades. O próximo ano ditará aquilo que eu quero realmente fazer no futuro.

Para já, o balanço é positivo. A par do estímulo intelectual, que tem sido sempre a fonte da minha força vital, a experiência de ensino tem-se revelado enriquecedora.

O veredicto fica para depois. Até lá, viverei o hic et nunc.


sexta-feira, julho 23, 2004

News Flash



Concluí a minha licenciatura.

Perdoem a minha paroquiana necessidade de partilhar isto com o mundo


segunda-feira, julho 12, 2004

Arte e os Artistas



Começou por ser um comentário meu aqui, mas que decidi transcrever aqui na íntegra.



"A arte, simultaneamente o cúmulo da inutilidade e a expressão máxima do génio humano, é intrinsecamente paradoxal.

O que leva uma sociedade a valorizar e admirar algo que não serve nenhum propósito utilitário, mas que apela incessamente às sensibilidades, ao sentido estético e mesmo à experiência do numinoso?

Posso oferecer duas respostas.

A primeira tem a ver com aquilo que é ser humano. A arte apresenta-se como um desafio às emoções, ou como uma experiência erótica. Porque a arte dá-nos prazer, dá-nos sensações intensas. Permite-nos admirar a beleza do nosso engenho e criar mundos imaginados, sugerir significados ocultos, estabelecer ligações insuspeitas entre entes banais...
A arte perfigura-se, assim, como a mais elevada das acções humanas. Algo que só pode ser levado a cabo por seres capazes de ver a essência do mundo real e, a partir dele, inventar um mundo novo que serve de suporte à obra.

A segunda pode ser ilustrada por outros exemplos da Natureza, em que parece estar-se a valorizar o inútil. Porque razão é que o pavão carrega as suas faustosas penas quando estas, sem dúvida, representam uma desvantagem no que diz respeito à evasão a predadores? A resposta é que um pavão que consegue exibir a sua magnífica penugem e, ainda assim, evitar predadores e apresentar um aspecto saudável é, efectivamente, um exemplar meritório e de um apelo sexual intenso para uma pavoa. Do mesmo modo, o artista na civilização humana é um ser atraente. Alguém que consegue criar algo inútil e, ainda assim, evitar ser um indigente é inevitavelmente sexy. E todos queremos ser sexy, mas só alguns acabam sendo artistas..

Bem hajam os artistas!"

Pedro Santana Lopes





O primeiro-ministro, doutor José Manuel Durão Barroso, pediu a sua demissão ao senhor Presidente da República tendo em vista a presidência da Comissão Europeia.

Um português como Presidente da Comissão Europeia é prestigiante para o País e, sobretudo, prestigiante para Durão Barroso que se torna, assim, o primeiro presidente da Comissão oriundo de um País não fundador. Não se adivinha nenhuma vantagem estratégica para Portugal porque a aceitação do cargo pressupõe, como seria justo e desejável, uma estrita imparcialidade no tratamento dos vários estados-membros.

A saída de Durão Barroso foi uma decisão pessoal, legítima, mas com consequências políticas inéditas em Portugal.

Em 2002 realizaram-se em Portugal eleições legislativas. Nos éditos publicados em todo o País, por essa ocasião, podia ler-se "Eleições para os Deputados à Assembleia da República".

Constituída a nova Assembleia, o senhor Presidente da República convidou Durão Barroso para formar governo, depois de ouvir os partidos com assento parlamentar e tendo em conta os resultados eleitorais.

O Governo da República é o órgão executivo da Nação e é responsável perante o Presidente e, no âmbito da responsabilidade política, perante a Assembleia da República (artº 190º da C.R.).

Assim, em Portugal, não se elegem Governos.

O Partido Social Democrata apresentou ao eleitorado, por ocasião das eleições, um Programa Eleitoral que foi sufragado. Na sequência da formação do Governo de Durão Barroso, para o qual se estabeleceu uma coligação com o CDS-PP, foi apresentado à Assembleia da República um Programa de Governo que foi aprovado.

Com a saída de Durão Barroso, e consequente queda do Governo, o senhor Presidente da República irá indicar um novo primeiro-ministro. O Governo que daqui resultar terá de apresentar à Assembleia da República um novo Programa de Governo. Os deputados com assento no parlamento que se encontram a exercer o seu mandato de quatro anos irão avaliar a compatibilidade deste Programa com o Programa Eleitoral que serviu de base à sua eleição.

Se o programa de Governo não for aprovado, o Governo cai.

Deste modo, em Portugal, os Governos dependem indirectamente dos Programas Eleitorais dos partidos que estão na base da eleição dos deputados à Assembleia da República.

Havia ainda a possibilidade de o senhor Presidente da República dissolver a Assembleia e convocar novas eleições. Isto faria todo o sentido caso estivesse em causa a legitimidade dos deputados eleitos ou se houvesse uma indefinição política que exigisse clarificação. Por princípio, o mandato dos deputados deve durar quatro anos e essa é a essência fundamental da democracia representativa.

Do ponto de vista político, não posso dizer que estou amplamente satisfeito com a perspectiva de o senhor Santana Lopes vir a ser primeiro-ministro de Portugal. No entanto, o senhor Santana Lopes tem tudo para me supreender pela positiva e muito pouco para me surpreender pela negativa.

A alternativa era, claramente, um governo socialista liderado pelo senhor Ferro Rodrigues.

A reacção de vários dirigentes socialistas à decisão do senhor Presidente da República foi, no mínimo, deselegante.

O facto de Ferro Rodrigues se demitir na sequência do anúncio da decisão presidencial invocando o facto de esta constituir uma derrota pessoal não só denota que o PS concebe a Presidência da República como uma espécie de órgão eleito por procuração como se constitui como um sinal de uma total ausência de sentido democrático e respeito institucional. O senhor Ferro Rodrigues teve muitas melhores oportunidades para apresentar a sua demissão. Ao apresentá-la agora, neste contexto, e a poucas semanas depois de um resultado eleitoral histórico nas eleições europeias só demonstra que o Partido Socialista estava longe de estar em condições para se apresentar a eleições legislativas com o ex-líder e de eventualmente formar uma equipa de Governo.

As declarações de Ana Gomes e de Manuel Alegre para além de invocarem novamente razões de natureza pessoal, que continuam a deixar-me perplexo pela sua imaturidade, acrescentaram ainda que a democracia estava em perigo. Ana Gomes disse mesmo que esperava que a democracia se restabelecesse em Portugal em 2006.

A gravidade destas declarações só pode ser mitigada pela possibilidade de estes senhores acreditarem genuinamente que só é possível uma Democracia com um governo socialista no Poder.

Apesar de acusações de populismo e demagogia, o partido agora liderado pelo senhor Pedro Santana Lopes teve uma postura muito mais democrática, muito menos populista e muitíssimo menos demagógica do que os partidos da oposição e, em particular, do que o Partido Socialista.

Espero, sinceramente, que esta postura de Estado evidenciada pelo PSD liderado por Santana Lopes seja o eixo condutor dos próximos dois anos. Se assim for, Pedro Santana Lopes começa já a surpreender-me.

Euro 2004





É difícil não ficar emocionado com que assistimos durante o Euro 2004.

As emoções, as bandeiras, o hino cantado em uníssono pelos inflamados peitos de portugueses e portuguesas. É difícil, porque tudo isto apela aos sentimentos mais primários de cada ser humano. Uma espécie de tribalismo moderno, que terá, certamente, o seu papel na prevenção da violência, permitindo a sublimação de alguns dos mais básicos instintos de territorialidade.

É também a prova cabal que o ser humano está inexoravelmente próximo do macaco. Não há nada de verdadeiramente digno, racional ou louvável naquilo que assisistimos durante essas últimas duas semanas.

É efectivamente a catarse do povo. A catarse pela alienação. De repente, nada mais importa.

E a união da tribo contra os bárbaros invasores não durou mais do que essas duas semanas. Não se extraiu daí nada que possa ser usado para o progresso do país, excepto algumas centenas de alcoólatras que descobriram que em Portugal se pode beber em todo o lado até às tantas da manhã e que, certamente, voltarão para estimular a indústria cervejeira.

Não teria sido mais barato fornecer gratuitamente a todo o país um alucinogénio com efeitos durante 15 dias? Do que construir uma dezena de estádios que estão agora condenados a ser fantasmas do europeu de futebol?

Sem dúvida, a organização do campeonato projectou grandemente a imagem de Portugal no estrangeiro e foi um exemplo de como um pequeno país pode levar a cabo um projecto da dimensão e complexidade do Euro. Mas não se retire mais do que isto. Não serviu, como muitos dizem, para dar um novo alento à alma lusitana. Todos esses efeitos foram meramente paliativos. Os problemas do País continuam os mesmos. O povo não está mais unido. A economia continua por reabilitar.

É preciso mais do que por as pessoas a pendurar bandeiras no estendal.

sexta-feira, julho 09, 2004

Não têm havido posts.. Estou demasiado ocupado a terminar a licenciatura.

Prevêm-se notícias dentro de uma semana, e comentários aos últimos acontecimentos.

sexta-feira, maio 21, 2004

Milagres





A indústria dos milagres move vários milhões de euros por ano em toda a Europa. Astrólogos, Tarólogos e outros Videntes prometem a solução para todos os problemas do quotidiano, fazendo recurso a "sabedorias ancestrais", pouco compreendidas pela actual sociedade. Este alegado desconhecimento não impede, contudo, que muitas sejam as pessoas que recorrem a este tipo de práticas numa tentativa de resolver as suas pequenas tragédias pessoais.

Não é necessário estar muito atento para ver solicitações deste tipo de serviços nos jornais e na televisão. Linhas de valor acrescentado, programas de computador, consultórios especializados.. todos prometem uma eficaz resolução dos problemas a troco de uma quantia em dinheiro que é relativamente modesta quando comparada com o efeito que é antecipado.

Políticos, personagens do jet-set e donas-de-casa, recorrem a este tipo serviços com regularidade e quase que se tornou politicamente incorrecto adoptar um atitude céptica face a estes milagreiros e milagreiras.

Em Portugal, o sensato Código de Publicidade dispõe o seguinte:


Artigo 22.º-B


Produtos e serviços milagrosos


1 – É proibida, sem prejuízo do disposto em legislação especial, a publicidade a bens ou serviços milagrosos.

2 – Considera-se publicidade a bens ou serviços milagrosos, para efeitos do presente diploma, a publicidade que, explorando a ignorância, o medo, a crença ou a superstição dos destinatários, apresente quaisquer bens, produtos, objectos, aparelhos, materiais, substâncias, métodos ou serviços como tendo efeitos específicos automáticos ou garantidos na saúde, bem-estar, sorte ou felicidade dos consumidores ou de terceiros, nomeadamente por permitirem prevenir, diagnosticar, curar ou tratar doenças ou dores, proporcionar vantagens de ordem profissional, económica ou social, bem como alterar as características físicas ou a aparência das pessoas, sem uma objectiva comprovação científica das propriedades, características ou efeitos propagandeados ou sugeridos.

3 - ....

4 - ....

5 - .....».


Apesar de, a meu ver, esta norma ser praticamente letra morta, uma vez que se fosse efectivamente cumprida não veríamos a quantidade de anúncios a linhas de Astrologia e Tarot que vemos na televisão, há casos onde foi efectivamente aplicada. Assim, recentemente, um astrólogo-vidente-cartomante foi condenado ao pagamento de uma sanção de 2000 euros por violação do supracitado artigo do Código de Publicidade. De recurso em recurso, o caso chegou ao Tribunal Constitucional, onde o réu arguiu que a referida norma se constituia como uma limitação inconstitucional ao direito à informação e à liberdade de expressão.

O Tribunal Constitucional indeferiu o recurso, referindo que a própria Constituição da República prevê uma disciplina para a publicidade e que a actual legislação cumpre irrepreensivelmente essa necessidade de regulamentação, não atentando contra os direitos referidos pelo recorrente.

Não posso deixar de me congratular por esta decisão. Que seja, ao menos, na sensatez das suas leis que Portugal tenha algo a ensinar ao resto do Mundo.

segunda-feira, maio 10, 2004



Não tenho quaisquer intenções de me tornar um crítico de televisão, mas há certas coisas que merecem um comentário.

Aquilo que deveria ser uma celebração da beleza feminina, está transformado num exercício cruel de apuramento da próxima rainha das mulheres-objecto.

Um homem que deve ter sido manequim na primeira república, uma tipa com um ego maior que o cérebro, outra saída de um filme da Adam's Family e um borjeço misógeno protagonizam um cobarde espectáculo de achincalhamento de jovens raparigas que têm a ingenuidade de pensar que se podem tornar pessoas melhores com idas ao cabeleireiro.

Da tolerável hipocrisia de declarações de amor pela paz e de solidariedade na luta contra a fome no mundo, involuímos para um espectáculo mediático de exploração da pobreza de espírito. Será delas, talvez, o reino dos céus, mas poupem-nos à terrena contemplação dessa humilhação auto-infligida.